segunda-feira, 30 de julho de 2012

- Onde está você?

Ontem eu representei uma pessoa sem nome. Ela (digo ela porque eu, que representei, sou uma mulher. Mas o personagem poderia ser homem) sofreu abuso quando pequena, e isso a transformou em uma pessoa amargurada, vivendo sempre em torno do seu passado. Desde o começo, quando soube que ia representar um quadro de pedofilia, eu soube que isso seria forte para mim. Aos poucos o porquê disso ser tão forte veio clareando em minha mente. Acho que eu teria sofrido igualmente pelos demais personagens da peça: O homem religioso, a mulher com uma doença incurável, a menina traída pelo amor da sua vida, e o menino sem pai. Seres humanos mexem comigo. Eu acho que por isso me protejo tanto deles! Mantive-me escondida por cerca de um ano. Mas quando eu toco novamente em uma ferida que não é só minha, mas de um mundo inteiro, eu sinto como se fosse explodir de dentro pra fora. A dor dos outros me faz soluçar de desespero, e acho que nunca vou conseguir entender ao certo o que é isso. É um dom? Sim, o amor é um dom. Então porque mantenho em mim, como meu pior defeito, o egoísmo? Não é contraditório uma pessoa possuir o dom de amar todos os seres humanos sem distinção, e ser egoísta? Mas se eu paro para pensar melhor, percebo que todos os momentos em que fui egoísta (foram em muitos momentos, sim!), eu estava afastada desse amor que não vem só de mim mesma. E ao mesmo tempo, quando estou coberta por esse amor, não existe egoísmo. Os dois não podem sobreviver juntos, é óbvio. E então, percebo algo sobrenatural que acontece (creio) não só em minha vida, mas na de todos nós: guerra em nós, nosso ‘eu’ terreno contra um ‘eu’ celestial. 
Na minha representação de pedofilia minha fala era a seguinte: Porque? Porque ele fez isso comigo? Eu era tão pequena quando ele me tocou. Porque ele me tocou assim? Eu me senti tão suja, desprezível. Tão indigna! Tão usada! Ó D-us, onde o Senhor estava enquanto aquilo acontecia comigo? - Essa última frase é muito forte! Já pensou? É algo que todos pensamos pelo menos uma vez na vida: Onde D-us está enquanto as coisas ruins acontecem. Talvez seu coração ainda não esteja sensível para entender sobre o que estou falando. Imagine a cena então: uma criança brinca sozinha no quarto, então um parente, um amigo da família, ou até mesmo um estranho, vem e tira dela seu algo mais precioso. Como ela se senti? COMO? O que ela faz em seguida? Como ela continua? Talvez você deva pensar que um bom terapeuta resolva posteriormente, ou que ‘o tempo apaga todas as coisas’. Mas eu quero te dizer que quando o nosso corpo é invadido, e nós nem fazemos ideia do que é isso ainda… Toda a nossa vida muda para sempre. As pessoas se tornam más mais cedo, e confiar em quem quer que seja é a tarefa mais difícil de todas. 
Não, eu nunca sofri abuso algum desse tipo. Mas quando eu disse: Ó D-us, onde o Senhor estava enquanto aquilo acontecia comigo? - Eu realmente senti que aquilo poderia ter acontecido comigo, e mais, senti que isso é real! Isso acontece nas nossas vizinhanças. Nesse exato momento. Em todos os lugares do mundo. Eu senti a tristeza das pessoas que sofreram isso, das crianças que estão sofrendo agora, de Deus que criou essas pessoas e deu-lhes o poder de fazer suas escolhas, e senti… Sim, eu senti o que seria arrepender-se de abusar de alguém. Essa é a parte mais complicada. 
Durante as semanas que ensaiávamos perguntei a Deus sem parar que tipo de amor é esse que Ele nos dá. Perdoar um pedófilo? Você perdoaria alguém que tivesse usado um filho seu? Porque esse é o ângulo em que Deus se encontra. Ele é o Pai, nós os filhos não é? Acontece, que o pedófilo, o pecador, ao se arrepender, também é filho. E agora? Diante do reconhecimento do seu pecado o que será que ele sentiria? - Eu invadi um corpo, uma alma, uma vida. Eu destruí um ser, que talvez esteja agora desejando estar morto. - Será que é possível que um pedófilo se arrependa? 
Corri para meu livro de respostas. Lembrei rapidamente, porque Deus sussurrou em meu ouvido, a passagem de Gênesis 1. 8,9,10. Adão e Eva ao comerem do fruto proibido cometeram o pecado de desobedecerem a D-us. Em seguida, cometem o segundo e terceiro pecado da humanidade: Orgulhosos, mentem e se escondem de D-us. Então, o pai bondoso e misericordioso pergunta a seus filhos: - Onde estás? , Adão envergonhado responde: - Ouvi a Tua voz no jardim, e como estava nu, tive medo e me escondi. Entendem? Sabemos que D-us onisciente não precisaria ter perguntado onde estavam, pois Ele sabia. Mas ele quer ouvir de nós! Ele quer que confessemos nossos pecados, e não nos escondamos. Adão reconhece seu erro, agora ele tem consciência de sua nudez, confessa que sentiu medo da Grandeza de seu pai. Que como bom Pai repreende seus filhos. Adão admiti que se escondeu. O que D-us espera de qualquer um de nós é isso. E perante Ele, somos definitivamente, iguais. 
Após muito refletir, cheguei a conclusão que quanto mais terrível possa parecer aos nossos olhos o quadro da pedofilia, o usurpador dessa questão não é pior pecador do que eu e você, e nossos vícios e fraquezas. Eu e você que negamos a Cristo tantas e tantas vezes. D-us nos ama igual! Há uma lógica diferença entre ser Filho e ser criatura. Mas diante do arrependimento, e da misericórdia de D-us, tudo isso desaparece! 
É difícil demais compreender esse amor, porque não é algo que possamos suportar. Pois somos humanos. E misericórdia assim, creio que só no Pai. Mas é fato que ele perdoa. E é fato também que é possível arrepender-se. 
Eu chorei por conta disso, porque é um mistério lindo demais pra eu suportar uma “seriedade” fingida. Mas quando orei e disse a D-us: - Pai eu quero sentir essa dor. Eu quero sentir essa dor… - E repetia consecutivamente, nada aconteceu. Só quando comecei a pronunciar a minha fala “decorada” eu verdadeiramente senti. A menina no quarto escuro chorando, sentindo ainda o nojo que dá, a sensação de despreparo. Ela pensa em algo que poderia fazer para esquecer que nunca mais poderá compartilhar com as amigas como foi sua primeira vez, nem poderá denunciar aos seus pais porque o culpado é um amigo muito íntimo. Eles não acreditariam nela. E se acreditassem sentiriam pena dela. Você gosta quando alguém sente pena de você? Ela pensa em se matar, mas nem isso acabaria com sua dor. Então ela abre a Bíblia e vê Deus perguntando: Onde você está?, e agora é sua vez de questionar: Deus, onde o Senhor está? - Ela se ajoelha no quarto tão escuro quanto a sua alma, e chora. E diz que se senti suja, indigna, desprezível. Então, uma luz brilha no escuro, e uma mão desliza em seu cabelo. Mas ela não senti medo dessa mão, porque ela sabe que Ele não vai machucá-la. E por mais forte que tenha sido a dor que sentiu, Naquela mão há uma paz que excede todo entendimento. E chora mais, e mais. Sabe porquê?… 
Talvez esse final de texto pareça dramático para você. Mas ouça: Deus chora sua dor. Porque quando ele te fez, sonhou coisas boas para você. E se hoje, você está passando por uma dor tão forte que você acha que não pode suportar… O dia em que a dor passa, chega. E você se levanta tão forte, e tão conhecedor do amor do Deus quanto qualquer outra pessoa. E conta-nos sua vitória.
Eu me sinto uma pessoa muito amada por D-us. Tive uma família não tão equilibrada assim, mas fui muito amada pelos meus parentes. Tenho grandes amigos, faço uma boa faculdade, e choro dores que não são minhas, apesar de ter minhas próprias dores. Mas sinto que não existem pessoas mais amadas por D-us e que sabem valorizar melhor as coisas que possuem, do que pessoas assim… Que sofreram dores que para nós, humanos, são imperdoáveis. Se D-us me ama, tão mimada e egoísta como eu sou, imagina você que perdeu seu pai, seus amigos, sua dignidade, que sofre todas as noites… Meu irmão, Deus te ama! Chora suas dores. E te pergunta: Onde você está?. Porque Ele quer que você o veja aí, do seu lado! Sempre do SEU LADO!
Quando a peça acabou e eu não “precisava” mais chorar, entrei em estado de estagnação. Comentei com uma amiga, que talvez a tristeza seja um “ser”. Um espírito sabe? E no momento que eu pedi a D-us para sentir àquela dor, Ele ordenou que esse espírito viesse e me cobrisse por alguns momentos. Para que eu sentisse essa amargura que não tem nome. Quando eu fui dormir, eu queria falar algo, mais… não sabia o que era. E chorei baixinho algumas vezes. E acordei assim, sem elo, sem chão. Foram mais ou menos… 14 horas de tristeza sem fim. Graças a minha personagem em uma peça! 
Mas, eu me pergunto… Se eu senti isso por 14 horas, como é sentir isso a vida inteira? 
Você quer respostas? Quer que a tristeza que sente vá embora?
Conte a Deus onde você está, e o que te levou até ai. Conte para Ele como você se sente. Ele pode até não te responder de imediato. Mas eu tenho certeza que você irá perceber a presença Dele, e como Ele se entristece de nossas tristezas. E o quanto o AMOR DELE é INCONDICIONAL.